direitos autorais de obras musicais

É incontestável: a música “Coração Cachorro”, gravada por Ávine e Matheus Fernandes, é um sucesso e, diga-se de passagem, até mesmo aqueles que não possuem muito apreço pelo ritmo sertanejo, certamente já ouviram o hit (ou parte dele), seja em eventos festivos ou até mesmo nos sons dos carros por aí à fora – até porque, a música já ocupa os primeiros lugares nas principais plataformas de streaming do país.

Além do inquestionável sucesso do hit – que era subestimado por grande parte dos amigos e conhecidos do compositor à época de sua composição[1], outra polêmica veio à tona: o uivo, que compõe parte do refrão da música, foi retirado de um trecho da música “Same Mistake”, do compositor britânico James Blunt.

Tamanha a polêmica da situação perante o mercado consumidor, que o próprio James Blunt postou um vídeo na plataforma TikTok no qual, de forma bem-humorada, interpretou uma versão mixada por ambos os hits – tão somente conectadas pelo uivo e, além disso, parabenizou os brasileiros pelo sucesso do hit, sendo que, por fim, disse que “enviaria seus dados bancários”, dando a entender – mesmo que de forma irônica – que a reprodução do uivo seria passível de indenização por direitos autorais.

Neste caso específico, há quem considere que o hit brasileiro é dotado de uma individualidade, de modo que a reprodução do uivo no refrão não constitui violação de direitos autorais e, por outro lado, há aqueles que consideram que os brasileiros deveriam ter obtido o consentimento específico e expresso do compositor britânico e dos demais envolvidos na criação musical, à luz da Lei nº 9.610/1998 (a “Lei de Direitos Autorais” ou “LDA”).

Polêmicas à parte, o caso chama atenção para uma discussão interessante no âmbito dos direitos autorais, uma vez que, ao passo que a LDA assegura ao autor da obra o direito de reinvindicação, conservação e modificação da obra, dentre outros, igualmente dispõe que não constitui ofensa aos direitos de autor a reprodução de pequenos trechos de obras preexistentes, desde que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e, ainda, não prejudique a exploração da obra reproduzia – isso é o que dispõe o art. 46, VIII.

Embora haja tal limitação, é importante considerar que, ainda assim, a LDA prevê, nos termos do Art. 29, que toda a utilização pública de obras artísticas, literárias e científicas depende da prévia e expressa autorização dos respectivos titulares. Assim, mesmo tratando-se de cópia parcial ou da mera reprodução de uivos ou trechos específicos de obras musicais, seja requerida a autorização prévia do autor da obra original, de modo a fim de mitigar riscos e evitar possíveis disputas judiciais.

No dia 05 de novembro, James Blunt reivindicou parte da autoria da música e está negociando um acordo extrajudicial com os compositores[2]. O britânico pede parte da autoria, de forma que seu nome passaria a constar juntamente com os dos demais compositores – sendo exercido seu direito moral de autor – e receberia um percentual pela reprodução da música, além de pedir uma compensação pelos lucros já gerados pela música – sendo exercidos seus direitos patrimoniais –.

Por fim, vale lembrar que, tratando-se de obras musicais, não só os compositores detêm direitos sobre as obras, mas também, sendo o caso, os intérpretes, produtores fonográficos, músicos acompanhantes e quaisquer terceiros que eventualmente tenham agregado valor à obra criada, ou seja, a utilização arbitrária e desautorizada de obras intelectuais – notadamente obras musicais, certamente pode gerar grande prejuízo ao infrator, ainda que este não tenha agido de má-fé.

 

 

[1]Disponível em: https://g1.globo.com/pop-arte/musica/noticia/2021/10/22/coracao-cachorro-e-cria-de-james-blunt-advogado-ve-identidade-propria-no-auuu-brasileiro.ghtml

[2] Disponível em: https://g1.globo.com/pop-arte/musica/noticia/2021/11/05/james-blunt-reivindica-parte-da-autoria-de-coracao-cachorro-e-negocia-acordo-com-compositores-brasileiros.ghtml?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=g1

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